No msn, ela contava ao amigo mineiro sobre a balada daquela noite. Sofrível. Acompanhara uma amiga animada a certo estabelecimento nos Jardins, de propriedade de representantes da mais fina elite paulistana, e o resultado não poderia ter sido outro: hordas de homens plastificados, robotizados, de peitorais assustadoramente definidos quase rompendo a camiseta justa, invariavelmente estampada com um brasão, corrente grossa no pescoço, cabelos duvidosamente penteados com gel. Até o cheiro daquelas criaturas era estranho. Simplesmente não pareciam desse planeta. A qualquer momento puxariam a máscara que recobria seus rostos e revelariam a sua verdadeira identidade alienígena. Sentira medo de olhar para os lados.
O amigo mineiro, ouvinte sempre atento e interessado, quis saber se havia rolado interação com o sexo oposto. Ela rebateu no ato: lera uma linha do que ela dissera? Achava que ela era mulher de dar mole para bonecos chuck? Ele assentiu, lera tudo. Mas ainda assim resolvera perguntar. Afinal, como se diz por aí, “no inferno abrace o capeta”. E completou: para mineiro, não existe queijo ruim.
Ela riu-se. Que revelação! Logo o amigo mineiro, sempre tão tímido, vira-e-mexe confessando seu sem-jeito na abordagem das mulheres, tão discreto. Não à toa se diz por aí que “mineiro come quieto”. Pois sim. Ora, ora...
De vez em vez ela se lembrava da máxima mineira: não existe queijo ruim. E ficava se perguntando quantas e tantas o amigo mineiro não devia estar aprontando, com tão poucas exigências em matéria feminina. Às vezes até se perguntava se não residiria no provérbio um tanto de sabedoria. Mas, ao lembrar dos chucks, rapidamente concluía que havia, sim, queijo de todo o tipo, mas nem todos eram para o seu paladar.
Tempos depois o amigo mineiro se aprochegou para uma visita à capital. Escolheram um bar simpático com banda de jazz ao vivo e aproveitaram para pôr em dia o assunto que o msn já não dava mais conta de atualizar. Papo vai, papo vem, voltaram ao tema dos queijos. Ele começou a teorizar sobre aqueles que, quando criança, ele julgava merecedores de ir à lata de lixo e, depois de adulto, passou a comer com gosto. Ela achou graça de ele tergiversar e comentou, maliciosa, que não era bem sobre queijo que eles falavam quando o dito veio à baila pela primeira vez...
Ele desentendeu-se. Sobre o que falavam então? Ela riu-se mais um pouco. Homem escorregadio... Tentou comer pelas beiradas: lembrava-se de uma conversa que haviam tido sobre “abraçar o capeta”? Ele lembrou, confirmou, mas garantiu que o queijo era uma coisa, o capeta era outra. Provavelmente falavam sobre comida quando ele pontificou sobre os laticínios.
Queria competir com a memória infalível da moça... Que não só se lembrava como tinha provas: guardara a conversa do msn. Assim que desse, demonstraria. E ainda arrematou: não se lembrava que tempos depois, em outra conversa ainda, ela perguntara a ele sobre a qualidade dos queijos em sua última visita a Minas? E ele respondera, malandramente, que “os queijos estavam perfeitos”? Queria agora convencê-la de que era realmente sobre queijos que eles falavam? O amigo afirmou, com patente seriedade, que da parte dele sem dúvida se tratava de queijos, laticínios, víveres, gênero alimentício.
Ela não quis dar o braço a torcer, mas encafifou-se. Seria possível que tivesse se enganado? Bem que às vezes achava o amigo mais apegado ao pé da letra do que ela... Na primeira oportunidade, correu para o histórico do msn.
Lá, no meio da conversa sobre chucks, correntes douradas, cabelos engomados, cheiros estranhos, interações com o sexo oposto e alienígenas, corria uma breve conversa paralela [entre colchetes] sobre o paladar infantil dela, que não se amigava ao álcool, e a sua preferência por um sabor de pizza que ninguém mais apreciava: catupiri com milho.
E logo depois da alusão do amigo ao amplexo no coisa-ruim, a máxima mineira [também entre colchetes]: não existe queijo ruim.
Ela teve que aceitar que Foucalt, Bakhtin, Freud & Cia. tinham razão. Impossível prever a infinidade de fatores que interferem no processo comunicativo...
O amigo mineiro? Um gentleman, é claro. Até que os queijos provem o contrário.
O amigo mineiro, ouvinte sempre atento e interessado, quis saber se havia rolado interação com o sexo oposto. Ela rebateu no ato: lera uma linha do que ela dissera? Achava que ela era mulher de dar mole para bonecos chuck? Ele assentiu, lera tudo. Mas ainda assim resolvera perguntar. Afinal, como se diz por aí, “no inferno abrace o capeta”. E completou: para mineiro, não existe queijo ruim.
Ela riu-se. Que revelação! Logo o amigo mineiro, sempre tão tímido, vira-e-mexe confessando seu sem-jeito na abordagem das mulheres, tão discreto. Não à toa se diz por aí que “mineiro come quieto”. Pois sim. Ora, ora...
De vez em vez ela se lembrava da máxima mineira: não existe queijo ruim. E ficava se perguntando quantas e tantas o amigo mineiro não devia estar aprontando, com tão poucas exigências em matéria feminina. Às vezes até se perguntava se não residiria no provérbio um tanto de sabedoria. Mas, ao lembrar dos chucks, rapidamente concluía que havia, sim, queijo de todo o tipo, mas nem todos eram para o seu paladar.
Tempos depois o amigo mineiro se aprochegou para uma visita à capital. Escolheram um bar simpático com banda de jazz ao vivo e aproveitaram para pôr em dia o assunto que o msn já não dava mais conta de atualizar. Papo vai, papo vem, voltaram ao tema dos queijos. Ele começou a teorizar sobre aqueles que, quando criança, ele julgava merecedores de ir à lata de lixo e, depois de adulto, passou a comer com gosto. Ela achou graça de ele tergiversar e comentou, maliciosa, que não era bem sobre queijo que eles falavam quando o dito veio à baila pela primeira vez...
Ele desentendeu-se. Sobre o que falavam então? Ela riu-se mais um pouco. Homem escorregadio... Tentou comer pelas beiradas: lembrava-se de uma conversa que haviam tido sobre “abraçar o capeta”? Ele lembrou, confirmou, mas garantiu que o queijo era uma coisa, o capeta era outra. Provavelmente falavam sobre comida quando ele pontificou sobre os laticínios.
Queria competir com a memória infalível da moça... Que não só se lembrava como tinha provas: guardara a conversa do msn. Assim que desse, demonstraria. E ainda arrematou: não se lembrava que tempos depois, em outra conversa ainda, ela perguntara a ele sobre a qualidade dos queijos em sua última visita a Minas? E ele respondera, malandramente, que “os queijos estavam perfeitos”? Queria agora convencê-la de que era realmente sobre queijos que eles falavam? O amigo afirmou, com patente seriedade, que da parte dele sem dúvida se tratava de queijos, laticínios, víveres, gênero alimentício.
Ela não quis dar o braço a torcer, mas encafifou-se. Seria possível que tivesse se enganado? Bem que às vezes achava o amigo mais apegado ao pé da letra do que ela... Na primeira oportunidade, correu para o histórico do msn.
Lá, no meio da conversa sobre chucks, correntes douradas, cabelos engomados, cheiros estranhos, interações com o sexo oposto e alienígenas, corria uma breve conversa paralela [entre colchetes] sobre o paladar infantil dela, que não se amigava ao álcool, e a sua preferência por um sabor de pizza que ninguém mais apreciava: catupiri com milho.
E logo depois da alusão do amigo ao amplexo no coisa-ruim, a máxima mineira [também entre colchetes]: não existe queijo ruim.
Ela teve que aceitar que Foucalt, Bakhtin, Freud & Cia. tinham razão. Impossível prever a infinidade de fatores que interferem no processo comunicativo...
O amigo mineiro? Um gentleman, é claro. Até que os queijos provem o contrário.