quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Tête-à-tête

Não é uma biografia sobre Sartre ou Beauvoir, a autora esclarece. Trata-se de um livro sobre a história de amor entre eles.

Se conheceram aos vinte e poucos anos, na época em que prestavam um exame de admissão ao cargo de professor de filosofia do Ensino Médio. Beauvoir flertava abertamente com Maheu, um amigo de Sartre que era bem casado e feliz. Foi Maheu quem deu a Beauvoir o apelido de “Castor” (porque “Beauvoir” se parece com “beaver”, a palavra inglesa que nomeia o roedor), apelido que Sartre e boa parte dos amigos usaram para se referir a ela durante toda a sua vida.

Sartre se interessou pela jovem Beauvoir, bela e extremamente inteligente, de fala rápida. Pediu a Maheu que marcasse um encontro entre os dois em um café. No dia marcado, Sartre sabia muito bem por que Beauvoir mandara a irmã em seu lugar para desculpar-se e dizer que ela não viria. Baixinho, zarolho e com a pele ruim, Sartre não causava uma boa primeira impressão nas mulheres. A consciência de Sartre sobre sua feiúra talvez tenha sido o primeiro passo em direção às suas concepções sobre o Existencialismo e a liberdade.

Superados os obstáculos iniciais, Sartre e Beauvoir logo viveram um encontro de almas e perceberam que se amariam durante toda a vida. Sartre, no entanto, tinha clareza de que jamais se casaria ou teria filhos. Dizia a Beauvoir que lhe daria o seu amor eterno e profundo, mas jamais poderia abrir mão de sua liberdade. Ele próprio estimulava que Beauvoir fizesse o mesmo.

Ao longo de suas vidas, Sartre e Beauvoir devotaram um amor um ao outro que consideravam “essencial”, enquanto experimentavam com outros parceiros amores “contingentes”. Para Sartre esse sempre foi o arranjo que melhor representava a ordem natural das coisas. Jamais demonstrava ciúme por Beauvoir e nunca a repreendeu por qualquer outro relacionamento.

Para Beauvoir, viver a liberdade pregada por Sartre não era tão fácil. Além de se consumir pelo ciúme, poucas vezes ela achava que as mulheres escolhidas por Sartre estavam à altura dele. De fato Sartre, um homem brilhante, costumeiramente se envolvia com mulheres frágeis ou pouco talentosas, que logo se tornavam dependentes financeiramente dele. Ele as sustentou até sua morte e chegou a adotar uma delas, que atualmente é detentora dos direitos autorais sobre toda a sua obra (e infelizmente não tem sido muito generosa para com o resto da humanidade).

Em poucas ocasiões Sartre e Beauvoir viveram sob o mesmo teto. Cada um deles viveu relacionamentos longos com outros parceiros. Beauvoir chegou a viver com um de seus homens por sete anos. Mas a condição para a sobrevivência desses relacionamentos paralelos era que os parceiros aceitassem que tanto Sartre quanto Beauvoir não eram um homem e uma mulher isentos de compromisso, livres e prontos para se entregar integralmente a uma relação. Eles tinham um ao outro e não abriam mão disso. É verdade que Beauvoir, mais do que Sartre, estava disposta a deixar tudo e todos, a qualquer momento, para estar com Sartre, e em algumas ocasiões isso lhe trouxe conseqüências amargas.

Foram parceiros sexuais durante os primeiros 15 anos dos 51 em que mantiveram o seu laço amoroso. Foram parceiros intelectuais durante os 51 anos de vida em comum. Fizeram da escrita o seu ofício. Era piada entre os amigos de Sartre e Beauvoir que “o Castor trabalhava como uma formiga”. Sartre também tinha uma urgência por escrever que jamais conseguia vencer. Durante toda a sua vida, escreveram durante seis a oito horas por dia. Sartre escreveu peças, romances, artigos e ensaios filosóficos. Beauvoir escrevia artigos, ensaios, romances e um volume significativo de obras autobiográficas.

Sartre e Beauvoir eram dotados de um enorme magnetismo. Eram admirados, lidos e venerados por pessoas ao redor de todo o mundo. Muitas das alunas de Beauvoir se tornaram suas amigas, depois amantes e, boa parte delas depois disso, amantes de Sartre também. Foi assim que Beauvoir acabou exonerada do seu cargo de professora; após a denúncia da mãe de uma de suas alunas. Todas essas pessoas com quem eles se envolviam e que, mesmo depois de findos os casos, continuavam em torno deles, dependendo financeira e emocionalmente dos dois, acabaram constituindo o que eles chamavam de “a família”.

Beauvoir, uma mulher inteligentíssima, articulada, esclarecida, cedo percebeu que a liberdade experimentada por Sartre jamais seria a mesma que ela vivia, por sua condição feminina. Abrir mão de se casar e ter filhos e viver esse relacionamento não oficial com Sartre causou grande desgosto à mãe de Beauvoir e fez com que ela não fosse considerada respeitável em muitos círculos sociais. Estimulada por Sartre a escrever sobre si mesma, sua vida, experiências e idéias, Beauvoir concebeu “O Segundo sexo”, até hoje uma de suas obras mais importantes e um grande ícone do feminismo.

Torturada por angústias permanentes que atribuía ao medo da morte, Beauvoir era dada a momentos de choro incontroláveis, que assustavam quem estivesse por perto por sua aparente fragilidade. Acostumou-se a fazer longas caminhadas para as quais dificilmente encontrava companhia. Sartre, em uma de suas cartas, chamou-a de “devoradora de quilômetros”. Essa era a maneira de Beauvoir de lidar com a sua sombra.

Alguns dos que se envolveram amorosamente ou sexualmente com Sartre e Beauvoir – particularmente as mulheres – consideravam sua forma de se relacionar doentia e destrutiva. Por vezes, Beauvoir e Sartre admitiram a si mesmos terem ido longe demais e causado danos permanentes a jovens a quem a liberdade à qual eles se dedicavam estava além do horizonte de possibilidades. Suas vidas não são impecáveis exemplos de moral e conduta; pelo contrário, refletem mais um exercício não acabado – mas profundamente vivido – de busca por essa tal liberdade, aquela que parece sempre um metro adiante de onde estamos, ou em nome da qual por vezes parecemos abrir mão daquilo que nos parece mais caro.

Tête-à-tête
não é uma biografia sobre Beauvoir ou Sartre. É sem dúvida uma história de amor. Um amor humano, tortuoso, ora egoísta, ora equivocado, mas sempre vivo. Alguém já disse que é a maior história de amor do século XX. A autora deixa ao leitor o veredicto sobre a verdade ou não dessa afirmação.

De minha parte, dentre tantas coisas que me deslumbraram nesse livro, talvez a mais cara tenha sido a velha conhecida lembrança de que existem tantas formas de amar quantas são as pessoas que amam.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Out of the closet

Se eu não posso culpá-la inteiramente, boa parte do meu sumiço se deve a uma certa ruiva. Antes de escorregar a caixa para as minhas mãos, alertou: “não abra na frente dos seus pais. Eles podem entender tudo errado...”.

E então eu descobri o fascinante mundo lésbico.

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Vinte e nove

A amiga da rua. As amigas do primário e do ginásio. As amigas do colegial. As amigas do primário, do ginásio e do colegial. As amigas da faculdade. A amiga do ginásio que só ficou amiga mesmo depois da faculdade. A ex-professora da faculdade que virou amiga e sócia. A amiga da faculdade que virou colega de trabalho. A ex-namorada do amigo do ex-namorado da irmã que virou amiga e vizinha de mesa no trabalho. A amiga que não é mais do trabalho, mas continua amiga. Os amigos do ex que viraram amigos. O amigo da amiga que virou amigo e também ficou amigo da outra amiga. O amigo que veio do espaço. A irmã que virou amiga. A colega de faculdade que ficou amiga mesmo quando namorou um amigo do ex. A prima que sempre foi mais amiga do que prima. O namorado da prima que virou amigo. A mulher do amigo do ex que virou amiga, vizinha e colega de trabalho.

Um amigo para cada ano de vida. Assim é que é bom.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Dez mil

Este dia chegou mais cedo do que eu esperava. Já faz um tempo que eu comecei a ficar de olho no marcador de visitas do blog pensando “preciso preparar um post especial para os dez mil”. De repente chega um comentário da amiga e descubro que já estou nos dez mil e seis. Mesmo um pouco atrasada, estou aqui para a comemoração da marca.

O Mulher Solteira nasceu em 5 de julho de 2007, catorze meses depois do meu retorno à vida solteira, mais ou menos uma semana depois de ter vivido pela quinta vez consecutiva, em poucos meses, a famosa síndrome do “por que ele não me ligou?”. Naquela época, voltar a entender o funcionamento do “mercado” consumia boa parte da minha energia e fazia o meu cérebro ferver. Escrever era uma forma de tentar pôr um pouco de ordem no caos e apaziguar a angústia de não entender o que os homens queriam, por que agiam como agiam, o que realmente significavam as suas palavras e também os seus silêncios.

De lá pra cá a “linha editorial” mudou bastante. Afinal, o blog acompanha a minha vida de Mulher Solteira e nos últimos meses decidi sair do campo de batalha e empreender uma nova missão: aprender a ser só. De “mulher solteira navegando sem bússola pela selva dos solteiros” me coloquei “em um rinque de sumô, face a face com a solidão”. Eu bem desconfio que a melhor forma de aprender com a solidão não seja chamá-la para a briga como estou fazendo, e sim me tornar amiga dela. Mas o caminho é longo e ainda tenho muito chão pela frente.

E agora chegamos aos dez mil acessos. Talvez alguns estejam se perguntando sobre a receita do sucesso para atingir tal marca. Quero dividir generosamente com vocês o segredo dessa façanha:

De 5 de julho de 2007 a 16 de fevereiro de 2008 tivemos 227 dias. Isso significa cerca de 44 acessos diários. Vamos dizer que tenho aproximadamente cinco leitores fixos e diários (nem todos comentam, mas alguns me confessam na vida real) e outros dez flutuantes. Isso já explica mais ou menos dez acessos (porque os flutuantes se revezam) por dia. Outros cinco acessos diários são meus mesmo: entro pra ver se os textos continuam no mesmo lugar, para me convencer de que o tamanho e a cor das fontes estão bons, para reler o post do dia anterior e ver se 24 horas atrás escrevi algum absurdo de que me arrependa, para encontrar comigo mesma ou simplesmente para “lamber a cria”. Os outros cerca de 30 acessos são assim distribuídos:

- Cinco pessoas estão procurando alguma referência aos seus livros preferidos da infância ou adolescência: “Poliana” e “Poliana Moça”;

- Cinco pessoas estão querendo saber como cuidar de uma árvore da felicidade;

- Cinco pessoas estão tentando decidir se devem ou não usar aliança de compromisso;

- Cinco pessoas estão procurando informações sobre o samba da Praça Roosevelt;

- Cinco pessoas estão usando o google como oráculo, procurando respostas para perguntas como “ele vai me ligar amanhã?”;

- Cinco pessoas estão procurando pornografia e, ao digitar expressões como “mulher dando de quatro”, misteriosamente são remetidas à minha página.

Aos meus leitores fixos e flutuantes, o meu muito obrigada (não teria cabimento agradecer a mim mesma pelos meus cinco acessos diários). Aos interessados na Poliana, na árvore da felicidade, nas alianças de compromisso ou no samba da Praça Roosevelt, lamento não poder ajudá-los, mas espero que tenham usufruído de uma leitura interessante caso tenham decidido perder alguns minutos com esse blog. Àqueles que usam o google como um oráculo, espero que encontrem as respostas que estavam procurando (e que descubram logo que o google serve para quase tudo, mas certas respostas só o tempo pode trazer). Aos que procuram pornografia, não se sintam logrados pelo google. Aprendam também que as aspas são de grande ajuda para que ele não se confunda na busca. E aproveitem para parar e usufruir das confissões de uma mente feminina, que às vezes pode ser ainda mais erótica do que as partes íntimas de uma mulher.

E que venham os próximos dez mil!

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Laço

- Oi, linda!
- Oi... tudo bem?
- Tudo, e você?
- Médio...
- Por quê?
- Solidão.
- Sei como é...

E isso já fez desgrudar as asas viscosas da mariposa pousada no meu coração.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Em nome da Ciência

Justificativa
Em nome do progresso científico, decidi entregar-me a um experimento. Meu interesse pelo tema surgiu de hipóteses do senso-comum que dizem que “quando menos se espera, aparece alguém interessante”, “quando você faz as coisas por você, e não pelos outros, se torna alguém irresistível” e “antes de gostar de alguém, é preciso aprender a gostar de si mesmo”. Assim, tomei a decisão de não realizar absolutamente nenhum movimento em direção à busca por um parceiro amoroso, ficante, rolo, paquera, one-night-stand, PA, ATT e similares, não significando, com isso, que eu estivesse fechada a qualquer uma dessas experiências. O coração do experimento consistia em não buscar, não procurar, não fazer nenhum esforço.

Objetivos gerais

- Fortalecimento da auto-estima
- Contemplação do vazio lúcido
- Aceitação do sentimento de solidão
- Exercício da paciência
- Aprendizado de auto-suficiência

Objetivos específicos

- Identificar se, de fato, “o universo conspira a nosso favor”
- Verificar se é possível conhecer homens interessantes na fila do banco, na padaria ou na locadora sem tomar absolutamente nenhuma iniciativa
- Investigar se “alguém de repente pode lhe oferecer flores”
- Constatar se é verdade que “o que é meu está guardado”

Metodologia

A metodologia utilizada consistiu na realização de absolutamente nada. Alguns comportamentos foram evitados:

- Entrar em sites de relacionamentos
- Sucumbir a blind dates patrocinados pelas amigas
- Enviar indiretas ao amigo gostoso da sua melhor amiga
- Procurar rolos, ficantes, one-night-stands, PAs ou ATTs do passado
- Sair para a balada com objetivos de caça
- Tentar conquistar o professor de violino da afilhada da sua amiga com um e-mail espirituoso

Resultados parciais

134 dias de seca

sábado, 2 de fevereiro de 2008

Carnaval

Mulher Solteira informa: este blog está fora da área de cobertura ou desligado.