quarta-feira, 2 de abril de 2008

Chá de sumiço


Federico, porto-riquenho radicado nos EUA, é agente funerário, tem cerca de 30 anos, é casado e tem dois filhos pequenos. Sua mulher, Vanessa, foi sua primeira e única namorada.

Após a morte da mãe, Vanessa embarca em um longo processo depressivo, ao qual Federico assiste, confuso e impotente. A presença da irmã de Vanessa em sua casa, estimulando-a a lidar com a depressão por meio do cartão de crédito e interferindo na educação dos filhos, é a gota d’água para que ele cometa a maior besteira de sua vida: envolver-se com uma prostituta.

O resto dessa história todos conhecem: mentira tem perna curta e logo a separação é inevitável. Arrasado, Federico ainda passa alguns meses “acampado” na mesa da sala de preparação de corpos da casa funerária onde trabalha, achando que a volta para casa é uma questão de tempo. Após uma “transa de recaída”, ele e Vanessa conversam seriamente e ela finalmente pede o divórcio.

Federico procura se conformar com o novo cenário. Arranja um quarto temporário na casa de seus sócios, que é também a casa funerária onde trabalha, e embarca na onda dos encontros virtuais. Um dia, durante o trabalho, uma janela “pula” de dentro do computador e Federico conta timidamente aos sócios que se trata de uma das garotas que ele conheceu pela internet. Antes de encerrar a breve relação digitando dez palavras apressadas, Federico explica a David e Nate que não houve química com a garota. Não parece perceber o espanto dos sócios quanto à objetividade com que deu o caso por encerrado.

Tempos depois, uma nova pretendente parece finalmente fazer o tipo de Federico. Depois de um ou dois encontros, Vanessa, com quem Federico ainda mantém uma relação amigável, convence-o a chamar o seu “date” para acompanhá-lo durante o casamento de seu sócio. Eles parecem realmente feitos um para o outro.

Alguns dias depois, Federico e a namorada estão na sala de TV. George, o novo marido da dona da casa (Ruth, que abrigou Federico por conta da separação) começa a se recuperar de um surto psicótico. George entra na sala em meio a um beijo ardente e, alheio aos acontecimentos, procura companhia por meio de assuntos irrelevantes e gestos de gentileza. Federico e a namorada não conseguem se desvencilhar do velho e ela decide que já é hora de ir para casa. Federico a convida para almoçar no dia seguinte e ela pede que eles combinem por telefone.

No dia seguinte, próximo à hora do almoço, Federico tenta falar com a namorada duas, três, quatro vezes. Mais tarde, deixa outros recados, concluindo que o horário do almoço já passou e ela provavelmente teve algum imprevisto. À noite, ainda sem notícias, Federico liga para a casa de Vanessa e avisa que não poderá levar os filhos para jantar, como haviam combinado, porque sua amiga está desaparecida. Vanessa se solidariza e aconselha Federico a ligar para a polícia.

Na porta da casa da moça, nem sinal. Não há resposta à campainha. O telefone continua tocando sem parar. Finalmente, Federico procura a síndica e implora que ela abra a porta do apartamento, temendo que algo sério tenha acontecido à namorada.
Por fim, porta aberta, a moça se assusta, se espanta e se irrita com a invasão: o que diabos vocês estão fazendo dentro da minha casa? Federico responde, com convicção: você sumiu! Fiquei preocupado... Combinamos de almoçar e você não atendia as minhas ligações!

A moça responde, entre incrédula e constrangida: pensei que você leria nas entrelinhas... Federico, ainda mais constrangido: ah, sim, claro... as entrelinhas.

Na noite seguinte, Federico tenta levar os filhos para comer uma pizza, mas Vanessa diz a ele que não pode marcar e desmarcar os programas com os filhos a toda hora. Aproveita para perguntar o que havia acontecido à moça que desaparecera durante todo o dia anterior. Federico, embaraçado demais para contar a verdade, diz que ela morreu de ataque cardíaco. Vanessa mal acredita na má sorte de Federico e acaba aceitando não apenas que ele leve os filhos para jantar, mas também lhes faz companhia durante a pizza.

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A seqüência de cenas descrita acima é um excerto da série Six Feet Under. Uma série cinco estrelas, que trata com profundidade e delicadeza o tema da morte e muitas outras questões e dilemas existeciais: o amor, a sexualidade, a solidão, a verdade, a identidade, a loucura, a arte...

Se a pincei dentre inúmeras outras que também me tocaram o fundo da alma, foi porque me vi nessa pequena tragédia do cotidiano de um coração romântico que, impelido pelas tormentas da vida (às vezes provocadas pelo seu próprio barco), volta a navegar sem bússola pela selva dos solteiros.

3 comentários:

Renatinha disse...

Me deu vontade de ver a série... tadinho do Federico!
beijos
Re

Ana disse...

Sei o que é. Namorei por 7 anos o amor da minha vida, ia me casar, mas uma tormenta chamada morte acabou com meus sonhos. E me fez voltar sem bússola à vida se solteira.
(ainda hoje me encontro a deriva,mas começo a querer remar, o que já é um grande passo, eu acho.

Mulher Solteira disse...

Rê,
a série vale muito a pena, recomendo!

Ana,
minha nossa... taí algo que não se deseja para ninguém... Sim, acho que querer remar é um enorme passo. E saber que a gente não tem mesmo controle sobre a vida é um aprendizado muito importante! Beijos, fique bem!