quinta-feira, 26 de julho de 2007

Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera

Relendo alguns textos que escrevi no ano passado, quando o Mulher Solteira ainda era apenas um projeto dormindo na gaveta do meu laptop, me dei conta de que, ao longo do último ano, passei por quatro fases bem definidas na minha recém-retomada solteirice.

A primeira durou uns três meses e meio e começou logo depois do término do meu último namoro. Como era de se esperar, naquele tempo eu ainda estava meio catatônica. Considero que isso é relativamente comum quando o término de um relacionamento é unilateral e inesperado, como aconteceu comigo. Por mais que eu me esforçasse para concretizar o que estava acontecendo, no fundo ainda tinha esperanças de que o fim do namoro fosse provisório, que aquela fase fosse passar. Tudo bem que menos de uma semana depois do término o ex deixou na portaria do prédio duas malas e três sacolas lotadas com todas as coisas que eu fui deixando na casa dele ao longo dos quatro anos de namoro. Foram as malas mais pesadas que eu já carreguei na minha vida – sozinha, sem ajuda do porteiro. Eu sabia que só eu podia carregá-las e mais ninguém.

Mas nem dá pra dizer que o corte do mal pela raiz tenha sido totalmente idéia do ex. Diferente do que aconteceu nas outras duas ou três vezes em que ele terminou comigo, dessa vez a conversa do término durou dez minutos. Eu já havia passado por aquela cena tantas vezes (embora a última vez tivesse sido muito tempo atrás) que de alguma forma fui me preparando ao longo dos anos para um fim digno, se um dia ele viesse. Não me rastejei, não implorei, não pedi explicações. Demonstrei, sim, o meu susto, a minha mágoa, a tristeza que eu estava sentindo. Mas não deixei a cena se estender por mais tempo do que o necessário.

E fui eu mesma quem pediu ao ex para devolver as minhas coisas. Na verdade, o que eu queria receber de volta eram as coisinhas da nossa “filha” (um mês e meio antes do término nós havíamos comprado juntos uma cachorrinha). Mandei um e-mail dizendo que havia pedido à nossa faxineira (sim, nós partilhávamos a mesma faxineira) que separasse a comida, a caminha e os brinquedos da Mimi e pedi para ele deixar tudo na portaria do prédio dele. Ele respondeu dizendo que separaria tudo ele mesmo e traria até a minha portaria. Muito cortês da parte dele.

Enfim, duas malas e três sacolas abarrotadas dos mais diversos pertences – roupas, livros, CDs, sapatos, nécessaire... – podem ser um sinal bastante claro de que o fim é definitivo. Mas nos telefonemas mensais que eu acabava fazendo ao ex nos momentos de desespero vinham sempre aquelas frases que a gente quer-mas-não-quer ouvir: “não tenho certeza do que estou fazendo”, “parece que me amputaram uma perna”, “sinto muita falta da nossa vida juntos”, “ainda te amo muito... mas preciso viver isso, passar por isso”. E então eu esperava, achando que ele passaria por aquilo e voltaria para mim.

A fase catatônica acabou quando eu descobri que ele estava namorando e, mais importante, que na verdade havia terminado comigo para ficar com essa pessoa. Outro detalhe importante é que essa mesma pessoa já havia motivado um término anterior (até então eu não sabia disso), mas na época ela não quis ficar com ele porque achou que ele ainda me amava e acabaríamos voltando. Voltamos mesmo. Fica a pergunta: Se eles tivessem começado a namorar naquela época, será que teríamos mesmo voltado? Enfim, como sempre diz minha amiga Cá, “a memória não tem caminho de volta”...

Seguiu-se a já famosa (que modéstia) cena da aliança de compromisso e mais uma e outra conversa que configuraram o término como definitivo. Foi só então que eu comecei a vislumbrar a possibilidade de voltar a ficar com outras pessoas.

A segunda fase durou outros três meses e vou chamá-la de fase de ambientação. Foi quando eu efetivamente voltei ao mercado e tive que reaprender a interpretar uma série de códigos masculinos que já haviam ficado enterrados na minha memória de 23 anos de idade. Eu cheguei a achar que os meus quatro anos de namoro haviam caminhado em paralelo a uma verdadeira reviravolta no mundo dos solteiros, pois alguns gestos e falas dos homens me deixavam absolutamente sem chão. Mas depois comecei a achar que eu havia sofrido mesmo uma profunda amnésia, recalcado algumas experiências desagradáveis e supervalorizado outras que não eram tão representativas dos meus tempos de solteira pré-namoro.

Fato é que, nesses meses de ambientação, eu precisei retomar algumas velhas questões femininas do tipo “por que ele não me ligou no dia seguinte?”, “por que nunca me interesso por quem se interessa por mim?”, “onde ele pensa que vai com essa mão?” e por aí afora. As paredes das boates presenciaram desde cenas picantes até perdidos, diálogos blogográficos, beijos sem palavras e muitas palavras sem beijos.

Mas naquela época tudo ainda era feito um pouco por obrigação. Em nenhum momento eu senti que estava desrespeitando o meu corpo ou os meus limites, mas também não sentia uma real excitação ou prazer em estar de novo no palco das seduções, olhar, ser olhada, despertar interesses, demonstrar (ou ocultar) interesses. Me parecia que aquele era o percurso natural a se seguir, por isso fui em frente, tentando reencontrar algum tipo de sentido enquanto buscava reconstruir a minha identidade que, durante quatro anos, havia se misturado tanto à vida, aos amigos, à família e aos interesses do ex.

Felizmente um gajo interrompeu esse ciclo de ajuntamento de pedaços com louvor. Foi o primeiro cara que realmente mexeu com os meus hormônios e com o meu coraçãozinho desesperançado desde o meu pé na bunda. Como pregam os manuais de auto-ajuda da mulher solteira, eu o conheci em um dia de absoluto desprendimento, quando fiquei sozinha em um bar muito querido por mim e algumas amigas depois que elas tiveram que ir embora para conseguir acordar no dia seguinte num horário de gente normal. Nesse bar a música, a cantoria e as sacudidas de esqueleto rolam soltas, por isso me senti à vontade para ficar só e, no auge da minha recém-conquistada alegria de solteira (e sem uma gota de álcool na cabeça), me misturei à multidão e cantei e dancei com os meus novos amigos. No meio deles estava essa figura meio engraçada, muito simpática, que cantava as músicas do Chico como se fossem dele.

Depois da última música (ao som da qual dançamos juntos uns três passinhos, embora não fosse uma música lenta), engatamos uma dessas conversas de gente que se conhece há anos. Em uma sentada falamos de trabalho, família, namoros, cachorros, sonhos... lá pelas tantas, antes mesmo de ter me beijado, o rapaz me convida para sair no dia seguinte. Isso provocou uma pequena pane nos circuitos elétricos. Peraí, isso ainda existe? Feliz da vida, dei o meu telefone e um beijo de presente para o rapaz.

No dia seguinte saímos, conversamos, rimos, nos divertimos e dormimos juntos. E depois ele foi comprar cigarros e nunca mais voltou.

Eu fiquei triste, confesso. Aliás, não preciso dizer que segui todo o protocolo de confirmação da mulher tira-teima (maiores detalhes no post “Eu tentei...”): liguei, liguei de novo, mandei torpedo... A história ainda teve um ou dois capítulos (como o telefonema que ele me deu, out of the blue, em plena noite de Natal, e que também contei no já citado post), mas não vingou. No entanto, rompeu paradigmas. Percebi que havia, sim, outras pessoas interessantes no mundo além do ex. Só faltava agora elas se interessarem por mim...

Mas em vez de essa experiência me fazer ficar fixada na idéia de encontrar uma cara-metade, serviu para eu desencanar de vez e me propor a viver cada experiência com total investimento e nenhuma expectativa, aproveitando ao máximo tudo o que ela pudesse me proporcionar (ou ensinar), por mais ínfimo que fosse. Em outras palavras: caí na gandaia...

Essa com certeza foi a fase mais divertida. Beijei muito, indiscriminadamente, dois na mesma noite, sem saber o nome, sem ter a ver, tendo a ver, com ou sem esticada, com ou sem interesse de reencontrar, achando bom, achando ruim mas achando bom, achando ótimo... Uma das coisas mais importantes dessa fase foi conseguir perceber, por experiência própria, o quanto sexo (ou química) e amor podem mesmo andar separados. Em uma noite conheci um homem que não atendia a simplesmente nenhum dos requisitos mínimos para sustentar algum interesse amoroso da minha parte: não gostei de como ele se vestia, não gostei do papo dele, não o achei bonito, não gostei muito do jeito como ele me tratou... ainda assim, por algum motivo, me senti extremamente atraída por ele. E, sabendo ou não o que estava fazendo, ele alimentou o meu interesse com muita ginga, levando quase três horas para finalmente me beijar e só o fazendo depois que eu praticamente me atirei em cima dele – e, rapaz!, o beijo repercutiu por todos os cantos do meu mundo.

É o tipo de coisa que faz a gente perceber que, com algumas pessoas, o que a gente tem é química, física, "elétrica", mecânica... com outras a gente tem literatura, filosofia, música... e o melhor de tudo, é claro, é quando a gente consegue ter tudo isso com uma pessoa só. Mas é tão raro...

Bom, no auge da minha desencanação e alegria de ser feliz, depois da minha resolução de ano novo de beber um pouquinho de vez em quando (e isso NÃO significa que eu vá começar a fumar no ano que vem, OK, amigas?) e os dois primeiros porres da minha vida, arranjei, quase ao mesmo tempo, os meus dois primeiros casos. Os casos, é claro, vão merecer um post a parte, quando tratarei sobre as diversas modalidades de relacionamento da pós modernidade, incluindo os PAs e os ATTs, de grande utilidade para a mulher solteira bem resolvida nos dias de hoje.

A questão é que nenhum dos dois casos passou do terceiro encontro. Um por falta de interesse de ambos os lados (e isso, acreditem, foi uma grande vitória para mim). Outro por falta de interesse do lado dele, mas, acredito eu, para o meu bem. E o fim dos dois casos quase simultaneamente acabou me jogando para a minha quarta fase, que é essa em que me encontro nesse momento.

A quarta fase é aquela em que você começa a sentir preguiça de beijar só por beijar e se cansa de conversar com homens acéfalos. Então você se lembra das histórias de amor que viveu (desde as mais breves e singelas até as mais longas e marcantes) e se pergunta: meu Deus, onde estão os homens realmente interessantes do mundo? Que saudade daquele tempo em que era possível conhecer alguém “com quem você quer falar por horas e horas e horas...”.

O bom é que essa fase começou mais ou menos na mesma época em que eu conheci a Cá, e com isso comecei a ter outras motivações para sair além dos homens: boa música, boas companhias, lugares novos, novas experiências. Justiça seja feita: boa música e boas companhias eu já tinha nas outras fases também... mas de uma hora pra outra as minhas amigas resolveram casar, ter bebê, arranjar namorado ou morar fora, todas de uma vez! Por isso a Cá foi um alento nesse momento de solidão solteira (aliás, um beijo pra Cá, que está viajando e fazendo falta por aqui!).

Nessas eu já venho há mais ou menos uns três meses... nesse meio tempo, acreditem ou não, só beijei uma vez... e, mais uma vez comprovando o que dizem os manuais de auto-ajuda da mulher solteira, foi em um dia em que eu estava cansada, com sono, sem nenhum alvo em vista e decidida a usar a noite para tentar entender o danado do jazz (esse que eu ainda não sei se é pra ser entendido ou só pra ser recebido, aceito, sentido)... E fui abordada por um mocinho que me pareceu tão diferente dos demais, e que apertou tantos botões de uma vez só e me mobilizou tanta coisa que eu nem consegui dormir direito durante umas três ou quatro noites. Pena que ele nunca respondeu o meu e-mail nem telefonema (na hora de ir embora ele me deu um cartão e não pediu o número do meu telefone – conferir o post “Mim Jane, you Tarzan”)...

Ruim para mim, bom para vocês. Foi graças a ele que o Mulher Solteira finalmente saiu da gaveta, pra dividir um pouco com o mundo todas essas emoções, angústias, dúvidas, certezas e aventuras de mulher...

10 comentários:

MH disse...

dá quase um estudo antropológico dos estágios de recuperação pós-namoro... meu ciclo foi um pouco diferente, mas um muito parecido! rs

E a fase mais legal é justamente essa, sair pra curtir a companhia de amigos, a música, sem "caçar", sem se preocupar com nada. E é a partir daí que as portas realmente voltar a se abrir...

beijo!

Nana disse...

Passei muitos anos namorando. Desde os 17, emendava um namoro longo no outro. Até que, 4 anos atrás, meu último ex terminou comigo. Fiquei arrasada, era sempre eu quem terminava.
Passei 4 anos solteira. No último ano, arranjei um casinho fixo, o que era muito confortável pra mim: sexo delivery com apenas um telefonema.
Aí, há um mês e meio, conheci o M. Ele não corresponde aos ideais de beleza que eu tinha. Mas é inteligente, carinhoso, divertido, sarado! E, meio sem perceber, acabei assim, completamente apaixonada.
Deixei a longa solteirice pra trás, mas aprendi muito com ela. A jogada é se cercar de amigos. Sair muito, mas sem ficar procurando um par. E abrir mão de padrões antigos que acabam afastando a gente das pessoas interessantes de verdade.
Beijo

fabiana disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
fabiana disse...

Menina, te vi lá no 'Homem cafajeste' e dei uma passada aqui. Você escreve super bem! Adorei tudo aqui.

Beijocas

Drika disse...

hum... acho q tô providenciando minha saída da solteirice. com um medo absurdo. mas vou arriscar.

ei, tô na pista há 2 anos e ñ sei o q quer dizer pa e att. pode me esclarecer por gentileza?!?! =)
obrigada!
beijos.

Anônimo disse...

MH,

hum, agora fiquei curiosa para saber qual foi o seu ciclo parecido com um dos meus! ;)

Cada um se recupera de um jeito... o importante é a gente ter certeza de que viveu tudo o que precisava pra enterrar o passado de vez e move on, né?

Nana, falou e disse!

Como comentei no blog do Cafa, embora seja natural a gente ficar mais exigente com a idade, é importante também aprender a exercitar a nossa tolerância... o amor pode estar onde menos se espera! Tenho fé!


Fabiana, que bom que você gostou! O meu lema no momento é "viver bem para escrever bem", hehehehehhe :)

Volte sempre!

Drika,

que bom!!! Fico feliz por você! Afinal, ser solteira é uma condição, e não um estilo de vida, hehehehehehehe... E arrisca mesmo, vai que dá certo?

Pode deixar que vou providenciar pra logo o post sobre PAs e ATTs... ;)

Anônimo disse...

E aí Cris? Valeu pelo beijo! Carol que me disse que eu estava aqui de participação especial no blog!
Adorei teu texto... vamos continuar exercitando o sambinha e o bom papo.

Anônimo disse...

Ei, Cá!

Você viu como nossa amizade tá rendendo post? Só o samba na Roosevelt já deu pano pra uma epopéia digna de Senhor dos Anéis, como disse um amigo meu...

Tô feliz que você tá de volta e ansiosa para retomar nossas atividades sambísticas. Pena que na sexta o cansaço e o pé machucado adiaram o retorno à gandaia...

Beijão com saudade.

Unknown disse...

onde eu compro o livro? rs adorei o texto, fazia mto tempo q nao me identificava tanto com algo.
cheguei aqui atraves do blog do Gaston. Adorei msm, mto bom, li alguns dos seus textos, e resolvi comentar nesse pq foi 10;

Parabéns!!1
Cris

Anônimo disse...

Oi xará!

Puxa, fiquei inchada que nem peru com o seu elogio... me lembro de você do blog do Gasta, minha sósia, né? Hehehehehehehehe :)

Que legal que você se identificou. Acho que dá pra saber que tudo o que eu "digo" aqui sai de lá das entranhas mesmo, né? Ah, essa arte de ser mulher (solteira)...

Volte sempre!